Imagem

Imagem

Select Language

sábado, 11 de fevereiro de 2012

"Meia noite em Paris": passado e presente convivendo em harmonia

Férias. Como sempre são só poucos dias (nunca consigo tirar o mês todo, mas até que gosto, porque fica sempre um gostinho de “quero mais”), mas até por isso (por serem poucos dias) cada dia de folga é quase um “presente dos deuses” – e parece que “os deuses” estão do meu lado.

Deitada na minha confortável chaise-longue, na minha varanda, eu aprecio o som que vem da minha mini jukebox (um mimo esse bibelô que fiz questão de me dar de presente), sintonizada na rádio Sul-América Paradiso, com uma ótima seleção de músicas nacionais intercalando com internacionais, passando de Beto Guedes a Sade, alternando com Sting, Titãs e James Taylor.

Céu límpido, nenhuma nuvem no céu, as estrelas brilham em volta da grande lua cheia e, em plena cidade grande, ao fundo da minha varanda, eu ainda tenho os resquícios da Mata Atlântica, que nas chuvas de verão me trazem aquele famoso cheirinho de terra molhada quando chove (e detalhe, sem o incômodo dos mosquitos tão comuns na região oceânica) e ainda me trazem o frescor e a brisa da noite, como um calmante para os longos e quentes dias de verão.

Ia acender as velas dos castiçais em pêndulo da minha varanda, mas a lua cheia se fez de luz, iluminando esses meus rabiscos, e assim sob a luz de um luar magnífico, esse texto vai “nascendo” lentamente, enquanto observo, do outro lado da varanda, o meu (ainda projeto de) futuro pomar – preciso comprar mais terra e adubo para o pé de acerola que ganhei do meu pai – lembrar de podar a pequena árvore, recomendação do meu pai que me trouxe, da minha cidade do interior, a pequena árvore frutífera plantada num vaso – promessa do fruto na próxima estação primavera/verão (acho que vou gostar da novidade, e quem sabe, me animo e começo a plantar também pitanga, mexerica e, quem sabe, até romã).

No passado, morávamos em casas com quintal, árvores e pomar. Agora, com a comodidade da vida urbana, tivemos que nos adaptar. E é o máximo, em plena cidade grande (claro que isso não é possível em qualquer cidade grande – Icaraí/Niterói tem essa vantagem, "mar e mato" ao mesmo tempo), da varanda do meu apartamento, sentir a brisa da noite, ver a lua cheia, estrelas num céu límpido, sentir o cheiro de terra molhada em dias de chuva (sem os incômodos mosquitos) e um pé de acerola com promessa do fruto no próximo verão..., têm coisas na vida que realmente não tem preço, essa é uma delas.

E enquanto a lua vai lentamente se escondendo por trás do meu prédio, vou escrevendo essas “mal traçadas linhas”, agora iluminadas pelas luzes do mini aparelho de som, na verdade uma réplica em miniatura da famosa caixa de som, uma jukebox dos anos 60, com suas luzes multicoloridas em movimento (mas, na verdade, bem diferente da original de década de 60, essa tem rádio AM/FM, toca CD e tem entrada USB para computador).

Uma graça essa réplica do passado em miniatura, adaptada com tecnologia moderna – é o passado convivendo com o presente, sem trauma ou crise. E pensando nisso, nessa mistura de pensamento que ora vai ao passado e ora volta para o presente, “para variar”, como sempre, me fez pensar em cinema, e me lembrei do novo filme do Woody Allen, concorrente ao Oscar 2012, “Meia noite em Paris”.
Owen Wilson (o próprio alter-ego do Woody Allen) interpreta um roteirista razoavelmente bem de vida em Hollywood, mas insatisfeito profissionalmente, preferia ser um escritor reconhecido, e seu grande sonho era ter vivido nos anos 20, que ele considera “a época de ouro”,
em que artistas de várias partes do mundo, ainda não tão famosos, circulavam pelas belas ruas de Paris em busca de inspiração (e muitos deles se fixaram na França até seus últimos dias de vida) , tais como o pintor espanhol Pablo Picasso, os escritores americanos Gertrude Stein, Ernest Hemingway e Francis Scott Fiztgerald (e sua instável esposa Zelda), o pintor francês Henri Matisse, o músico americano Cole Porter, e os surrealistas espanhóis o cineasta Luís Buñuel e o pintor Salvador Dali (vivido pelo ótimo ator Adrien Brody), todos “figurinhas fáceis” que circulavam pelos ateliês e cafés da cidade-luz.

E a genialidade do diretor nos faz voltar ao passado, junto com o protagonista, sem necessidade de efeitos especiais mirabolantes nem explicações científicas para “a volta no tempo”. Simplesmente à meia-noite em ponto, a cada badalada de um sino de igreja que toca na madrugada parisiense, aparece um daqueles belos carros anos 20 e transporta-nos, junto com o protagonista, para o mundo dos artistas. E lá estão eles, simples assim, discutindo as suas (futuras grandes) artes nas mesas dos bares, expondo suas carências, invejas, seus medos e receios.

A atriz Marion Cotillard (a “Piaf” do cinema), a musa que serve de inspiração para (e rixa entre) Picasso e Matisse, por sua vez, tem como sonho de consumo, viver na “Belle époque”, no final do século XIX, no auge do Moulin Rouge, e dançar o cancan (para recordar, assista o belo musical “Moulin Rouge”, dirigido por Baz Luhrmann – na lista de filmes no blog), e para surpresa do embasbacado protagonista, os que vivem na “Belle époque” também estão insatisfeitos com a sua época, e consideram a Renascença “a verdadeira época de ouro” da cultura européia.

O filme tem a participação da primeira dama francesa, a Carla Bruni, e conta também com a veterana Kathy Bates (numa performática imitação da escritora americana radicada na França, Gertrude Stein, com seus inúmeros amigos artistas de todo canto do mundo, principalmente o francês Henri Matisse e o espanhol Picasso, para quem posou para várias célebres telas desses dois renomados pintores).  E a bela Paris está lá, sob sol, sob chuva, sob neblina, de dia, de noite, no passado e no presente, mais bela que nunca, na esplêndida fotografia do filme (mas não foi indicado ao Oscar como melhor fotografia – as indicações foram melhor filme, diretor, roteiro original e direção de arte).

Woody Allen provoca o telespectador (quando usa o erudito e boçal amigo da noiva do protagonista, um “pseudo-intelectual” – papel do ator Michael Sheen – como o rotula o protagonista, ao ver o tal discursando pelos jardins de Versalhes e pelos corredores do Louvre), mostrando que a arte não deve apenas ser ostentada, mas sim experimentada.

A citação da aristocracia de “O anjo exterminador” é uma das melhores piadas do filme (como sempre sutis as piadas de Woody Allen, nunca a ponto de se gargalhar, tem sempre que se prestar atenção na sutileza dos seus diálogos), quando o protagonista “dá a dica” para um ainda jovem e confuso Luís Buñell, para a idéia surreal do famoso jantar do seu futuro filme, em que os convidados aristocratas não conseguem sair da sala sem que haja uma explicação racional para isso, e “as máscaras” caem expondo as verdadeiras facetas dos personagens do filme da década de 60 ( Buñell praticamente fez um "reality show" surrealista - veja, no final do texto, entrevista recente da atriz principal Sílvia Pinal, comentando sobre a genialidade do diretor espanhol) .

Mesmo para quem não conhece a fundo arte e cinema, o filme de Woody Allen “vale o ingresso” (aliás, sempre valem), pois faz a gente refletir sobre a nossa eterna mania de desqualificar o presente exaltando o passado, e de quebra é um ensinamento para vivermos o presente da melhor maneira que nos for possível.

No filme, o protagonista está prestes a se casar com alguém com quem não combina e nem compartilha nada com ele – gosto muito de uma música, do Celso Blues Boy, intitulada “Sentindo calor e tremendo de frio”, em que ele diz “eu tenho alguém, mas me sinto sozinho”, pois é bem típico do que encontramos por aí, como no filme, relacionamentos sem calor, sem paixão, ter alguém só prá dizer que não se está sozinho.

E pensando no filme, chego à conclusão que sou uma ótima companhia para mim mesma, é bom aprender a conviver com a gente mesma, sem precisar depender de ninguém, para curtir a natureza, e se alegrar com um pé de acerola num vaso.

Filhos? Amigos? Parentes? Companheiro? Importantes, mas tem hora que precisamos desse tempo para nós mesmos, ouvir a voz dos nossos pensamentos, do nosso coração. Logo mais, filhos, parentes e amigos  vão chegar, viagem de férias de navio pelas águas brasileiras, e como sempre eu associo a minha vida ao cinema, espero que não seja uma furada, como no filme “O cruzeiro das loucas” – esse filme é uma comédia de “segunda categoria” (apesar de ser protagonizado pelo conceituado ator Cuba Gooding Jr), mas dá prá assistir (só não é tão bobinho assim, tem umas cenas picantes, assim é bom assistir antes dos pimpolhos). E espero que o comandante do navio não seja outro "zé mané que se acha o tal", como esse recente acidente trágico que acabamos de presenciar por conta de irresponsabilidade e exibicionismo.

Quanto ao companheiro, estou aguardando um que se habilite, mas tem que ser alguém que chegue de mansinho e me faça companhia no silêncio da noite em plena cidade grande, e que curta cinema assim como eu. Difícil? Sim, mas não impossível.

Volto do passeio de navio a tempo para a festa do Oscar (parece até que vou estar presente nesta, que já é considerada festa de “cartas marcadas”, mas cinéfilo é assim mesmo, assiste a todos os festivais e premiações, fazer o quê? melhor que assistir a baixarias como as atuais novelas e BBBs da vida).












Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...