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sábado, 26 de março de 2011

Traição masculina e feminina: quem assume a liderança e sobe ao pódio?

O cinema sempre me leva a devaneios. Mesmo nos filmes sem muita importância, sem muito conteúdo (desde que não seja puro “trash”), sempre procuro extrair alguma reflexão sobre o tema em questão. 

O filme “Alfie, o sedutor” é um desses filmes.  Refilmagem do britânico “Alfie - como agradar as mulheres”, da década de 60, com o então “machão chauvinista” Michael Caine, que tem uma crise de consciência questionando seu “estilo playboy de ser”, o filme de agora traz o charmoso Jude Law no papel do “Don Juan” em crise. O filme conta também com as atrizes Marisa Tomei e Susan Sarandon, como algumas das mulheres que não resistem aos galanteios e investidas de Jude Law.

No remake atual, já não cabe, em plena era AIDS, o hedonismo descompromissado do movimento hippie da década de 60, mas como no filme original, o sujeito continua egoísta e manipulador, deixando mágoas e ressentimentos por onde passa. No entanto, já não se pode dizer que suas “vítimas” sejam tão inocentes como as do seu antecessor, na década de 60 (naquela época, apesar da “queima de soutiens”, a reputação de uma mulher ainda ia “ralo abaixo” ao se envolver com um sedutor cafajeste e galinha). Agora o novo Alfie é um sujeito cujo maior pecado é a imaturidade, mas a verdade é que sempre haverá “Alfies” a solta por aí, e sempre haverá mulheres desavisadas que continuarão caindo em sua rede.

Refletindo sobre o tema – dizem as “más línguas” (leia-se machos em geral) que nós, mulheres, reclamamos, mas que “no fundo, no fundo, adoramos homens-galinha”. Na verdade, há uma pequena verdade por trás dessa “máxima” dos homens (justificativa fajuta para continuarem a nos trair), e é a de que existe realmente um grupo de mulheres que, ao se depararem com um homem sabidamente galinha, confessa imediatamente “aos seus botões”: “Oba, oportunidade a vista”.

Sim, oportunidade. Parece piada, mas é verdade. Algumas mulheres enxergam no homem-galinha “uma oportunidade”, pois homem-galinha não faz muita escolha, e a chance aumenta para essas mulheres que não se sentem capazes, no calor da disputa pelo sexo oposto, de conquistar um homem por seus próprios méritos, e ela sabe que o homem galinha não vai fazer questão de muita “qualidade”.

Ou seja, a auto-estima dessas mulheres está em geral muito comprometida, e esses sedutores modernos, espertamente, não agem mais como os antigos e brutos machões (como no original do filme de 1960), hoje eles são sutis, dúbios, preocupados em não “magoar” as parceiras (se é que isso é possível, como assim acha o tal Alfie do filme em questão), e facilmente consegue levá-las na lábia.

Quando a mulher que tem senso de auto-preservação, e que tem amor próprio, percebe que caiu na lábia de um deles (às vezes, não é fácil identificá-los, logo de cara), imediatamente cai fora, sem olhar prá trás, pois sabe que o futuro ao lado de um homem galinha é sofrimento na certa, é como aceitar viver ao lado de um alcoólatra, um vício difícil de curar. Assim como o homem não leva a sério uma mulher-galinha, a mulher que busca um relacionamento adulto maduro, não tem também interesse em se envolver com um homem-galinha (e sem entender isso, o tal Alfie se surpreende quando é, literalmente, posto de lado e trocado por outro).

Mas, ao contrário, algumas mulheres carentes, ainda nos dias de hoje, acham que irão salvá-lo do “vício” e que, “com ela, ele vai mudar”. Não percebem que ele escolheu flertar com ela, em detrimento de "todas as demais ao redor", não porque a achou "interessante", mas sim porque, espertamente, ele "sondou" e percebeu que, carente, ela seria uma "presa fácil". E elas acreditam piamente no efeito “bumerangue”, de que o homem sai com outra, mas voltará sempre para os seus braços. E a volta do “bem amado” é então interpretada, equivocadamente, pela mulher com carência e necessidade de auto-afirmação, como uma “prova” de que ela é melhor que as outras, que ele a preferiu no lugar de todas as outras, que ela é a “matriz” e as outras “apenas filiais”.

E, segundo especialistas em psicologia clínica, a mulher que se sente atraída por homens assim, pode indicar ainda um componente reprimido. A relação seria uma forma de vivenciar, através do parceiro, o desejo de ser sexualmente livre e de ter vários amantes. Parece maluquice, mas conheço mulheres que confessam se sentir exatamente assim, é quase uma autorização implícita da mulher, diante da sociedade, para trair sem grilos ou julgamentos – tipo “ele me trai, então eu também posso trair”. Algumas mulheres até se declaram "hormonalmente masculinas" e dependentes de "sexo por sexo" para sobreviver (não acredito nisso nem em homens, afinal, que eu saiba ainda somos animais racionais).

Por outro lado, segundo estudos comportamentais, esses tais sedutores compulsivos têm alguns traços típicos (e o tal Alfie é um deles): em geral são homens inseguros (embora nem sempre aparentem isso), com sérios problemas de auto-estima na área emocional (mesmo que bem sucedidos profissional e financeiramente), têm muito medo de ficar sozinhos, com vários conflitos emocionais não resolvidos. Têm muito medo de serem rejeitados e uma enorme carência, procurando em cada mulher o vazio existencial que carrega dentro de si mesmo (é a tal “paz de espírito” que o Alfie confessa, apesar de não muito convincente, no final do filme).

E acaba, assim, havendo quase que um pacto inconsciente da parte dos dois – o homem galinha se sente confortável com a mulher que aceita os seus pulos de cerca sem questioná-lo, e sem medo de que ela o abandone (como faria outra mulher com amor-próprio e auto-estima), por isso vemos tantos casais em que todos sabem que o fulano é galinha e a mulher mantém-se ao seu lado “sem reclamar" mas, detalhe, hoje em dia, não necessariamente submissa e casta.

No filme atual, ironicamente, a maior “rasteira” que o tal Alfie leva é justamente das mulheres que ele menos esperava – a meiga Marisa Tomei que o troca por alguém que a respeite, e a sensual “coroa” Susan Sarandon que, divinamente, o faz provar do seu próprio veneno, e o deixa literalmente “com as calças nas mãos” (veja o filme e delicie-se com o sutil "tapa na cara" que ele leva da libidinosa, e também promíscua como ele, Susan Sarandon).

“A galinhagem masculina é uma agressão à integridade emocional feminina”, disse uma especialista em psicologia clínica, “o risco que a mulher corre é não conseguir distinguir que o problema é do homem, e passar a se auto-depreciar, achando que se ele procura outra, o problema é dela que não consegue supri-lo”, continua a especialista. “Ou então, surge o desejo de se vingar, repetindo o comportamento masculino, seduzindo vários parceiros, realimentando o círculo do poder, ciúme e disputa, e negligenciando suas próprias necessidades emocionais”, conclui a especialista.

E é verdade. Com a revolução sexual, as mulheres já não se “guardam” mais como antigamente, e hoje em dia o número de mulheres comprometidas que andam “pulando a cerca” não é pequeno, muitos desses homens que acham que têm uma mulher, na redoma, a espera deles, se surpreenderiam se realmente soubessem o que se passa enquanto eles estão na rua, “trabalhando ou também pulando a cerca” (eu mesma já me surpreendi com mulheres que eu mesma jamais imaginaria que tivessem traído seus parceiros, se não fossem elas mesmas que me tivessem confessado).

E hoje, virou um páreo duro, entre homens e mulheres, para saber quem sobe ao pódio e assume a liderança no quesito traição. No fim, é triste saber que as pessoas estão deixando de viver intensamente pelo menos um único e verdadeiro amor, porque têm medo de enfrentar um relacionamento completo (leia-se “respeito mútuo e consequentemente fidelidade”), e passam a vida toda na ilusão de um dia ser feliz buscando no parceiro (e em mais de um, ao mesmo tempo) o preenchimento do próprio vazio existencial.

Voltando a “Alfie, o sedutor”, o filme tem muitas falhas, e na verdade acaba sendo uma comédia dramática despretensiosa, passando muito superficialmente pelo tema “relacionamento adulto”, e talvez o mais interessante do filme sejam as belas tomadas (noturnas principalmente) das ruas de Manhattan, e a excelente trilha sonora, com a voz performática e inconfundível de Mick Jagger, que também aparece, nas belas fotografias em preto e branco, nos créditos finais, (e que também homenageia o “Alfie original”, o ator Michael Caine) – veja no final do texto, Jude Law cantando com Mick Jagger, no "making of" do filme.

E, voltando ao tema do filme, me lembrei de outro bom filme que segue o mesmo tema – “Um grande garoto” (“About a boy”) com o irresistível sotaque britânico do charmoso ator Hugh Grant, que também faz o papel de um sedutor sem escrúpulos, que se envolve paternalmente com um menino sensível e sua mãe descolada (e paradoxalmente deprimida - a ótima atriz Toni Collete), que o faz repensar a sua vida superficial e egocêntrica de "playboyzinho" desprezível.

O filme, também com uma bela trilha sonora, consegue se livrar dos clichês de sempre das comédias românticas, ou seja, num “enlatado qualquer”, o sujeito almofadinha e desprezível se transformaria  num novo sujeito, sem falhas de caráter, se apaixonaria pela mãe depressiva do garoto e viraria o “padrasto que mamãe pediu a Deus” e então “viveriam felizes para sempre”. Veja trailer do filme, no final do texto, e a "canja" de Roberta Flack, cantando "Killing me sofly with his song", a badalada música dos anos 80, que o menino dedica, no filme, a sua "mãe" Toni Collete.

Para finalizar, deixo a frase do dramaturgo e diretor Domingos de Oliveira que, certa vez, disse, com extrema sabedoria: “os relacionamentos não acontecem necessariamente para nos fazer felizes; o que realmente importa é que, felizes ou não, nos faça sentirmos vivos”, e para nos sentirmos vivos é preciso, a meu ver, ter auto-estima, amor-próprio e respeito mútuo (e isso para mim, inclui necessariamente fidelidade).

E, da próxima vez, antes de partir para uma "aventurazinha sem compromisso",  pense bem antes, pois você pode estar, indiretamente, dando "carta branca" para a sua parceira fazer o mesmo.

E como já disse em outro texto, homem galinha que vive “pulando a cerca”, sinceramente, prá mim, não serve nem prá limpar o cocô do meu cachorro (que eu nem tenho). E veja abaixo, como uma mulher poderosa, bem resolvida e segura de si mesma, se livra, com muita classe, do sedutor compulsivo "que se acha".













domingo, 20 de março de 2011

Filmes antigos em preto e branco: por que não?

Acho incrível como os jovens, dos dias de hoje, perdem tanto tempo em conversas inócuas, nos “Facebooks da vida”, onde só o que se vê é um “homicídio doloso” da nossa língua portuguesa, com uma profusão de erros crassos que dá dó (uma enquete nessas redes sociais sobre isto, seria mais ou menos assim: vcs naum axam ke estaum açassinando u noço purtuguez neças redis sossiais?).

A internet é uma ferramenta fenomenal, tanto de entretenimento, como de informação, de troca de conhecimentos, de divulgação de arte e de cultura, praticamente sem limitações e, no entanto, infelizmente, é muito mal aproveitada por essa novíssima geração, que já nasceu informatizada (e paradoxalmente, está cada vez menos informada).

Nós, adolescentes das décadas de 70/80 (a chamada geração coca-cola, “os filhos da revolução”, como dizia Renato Russo, na sua música sobre a famosa geração), gerações pré-internet, pré-celular e pré-videocassete e DVD (e agora também o Blu-ray), éramos escravos do monopólio da Rede Globo – assistíamos ocasionalmente filmes de qualidade, na telinha da tal “rede plim-plim”, e quando perdíamos parte do filme, ficávamos reféns de reprises, que nem sempre aconteciam. 

rede Bobo, ao seu bel-prazer (não havia, ainda, nem a “sessão interativa”), sempre reprisava sub-repticiamente, em demasia, os famosos filmes enlatados sofríveis, e o filme cult nada, “neca de pitibiribas”, a não ser nas poucas datas comemorativas, como na semana do Natal ou Ano Novo.

O cinema, então, era nossa redenção, mas mesmo na telona, nós interioranos (eu nasci e vivi a minha adolescência no interior do estado do Rio de Janeiro) não tínhamos acesso fácil a grandes produções cinematográficas, como acontecia nas capitais, e ainda havia, mesmo nos grandes centros, o rigor da censura que barrava, na época da ditadura militar, muitos filmes rotulados como “subversivos”.

Foi assim que, na década de 70/80, ainda adolescente e já “cinéfila de carteirinha” (sem nem saber ainda o que isso significava), assisti, pela primeira vez, no já então famoso “corujão” da Globo, o filme “O milagre de Anne Sullivam (“The miracle worker”) sobre a vida real de Helen Keller, filmado em 1962, em preto e branco, com a atriz Anne Bancroft, numa atuação impecável que lhe rendeu o Oscar de melhor atriz na época (assista abaixo e no final do texto).




A atriz Anne Bancroft, apesar da excelente atuação e o (mais que) merecido Oscar, ficou, no entanto, mais conhecida na década de 80, pelo seu desempenho como “Mrs Robinson”, a futura sogra que seduz o ingênuo Dustin Hoffman, no filme “A primeira noite de um homem” (“The graduate”) – veja trailer, no final do texto, deste também ótimo filme, e a bela trilha sonora composta por Simon and Garfunkel, com a famosa dupla no show apoteótico no Central Park, em Nova York, na década de 80.

Bancroft vive em “The miracle worker” o papel da verdadeira professora estadunidense que, na década de 30, com métodos nada ortodoxos para a época, consegue ensinar a então menina Helen Keller, cega e surda (e consequentemente muda), a ter uma vida digna, apesar das limitações físicas, tornando-se inclusive escritora e ativista social quando adulta.

A verdadeira professora Anne Sullivam também havia sido quase cega, recuperando parcialmente a visão depois de duas cirurgias, e ao deparar com a menina cega e surda (que não tendo como se comunicar, tornou-se violenta e selvagem, sob os mimos exagerados da família abastada, que a tratava como um bichinho de estimação), consegue ensinar a menina a se comunicar, por meio da linguagem dos sinais, através do tato.

Ainda menina, fiquei impressionada com a história (verdadeira) e a atuação das duas atrizes principais (além de Bancroft, a estreante pré-adolescente Patty Duke ganhou o Oscar de melhor atriz coadjuvante), mas nunca mais consegui rever esse filme, e hoje, com a internet, posso assistir a todo o filme pelo youtube (pois não se encontra fácil em locadoras) – milagres da tecnologia que só quem foi adolescente na época pré internet pode ter noção da maravilha e magnífica ferramenta que é a internet, e que infelizmente os jovens da geração século XXI desperdiçam em longos e insossos bate-papos virtuais, bisbilhotando a vida alheia, nessas inóspitas redes sociais da vida.

A história foi refilmada no ano 2000, em versão “tecnicolor”, com a própria atriz Patty Duke, agora no papel da professora Anne Sullivam, mas essa nova refilmagem não chega “aos pés” da primeira versão cinematográfica, em preto e branco, de 1962. É pena que, por ser em preto e branco, muitos façam cara de muxoxo, com desdém (mesmo os “velhos jovens” da antiga geração coca-cola), menosprezando a verdadeira relíquia que é esse filme.

No final do texto, assista, além do trecho do filme, a uma entrevista da verdadeira professora Anne Sullivam com sua aluna Helen Keller já adulta, mais um raro documento dos anos 30, cujo acesso fácil só é possível com o advento da internet. E é mandatório que nós, das gerações anteriores, passemos tais relíquias, de geração em geração, como um aprendizado de vida e de perseverança, e de que nem tudo que é velho, necessariamente, está obsoleto, e assim ensinar essa novíssima geração a valorizar indiretamente os nossos velhos.

Vale muito a pena assistir ao filme, pois a interpretação corporal das duas atrizes é magnífica – a menina cega e surda que se comporta como um animalzinho sem modos e sem limites, e que, rebelde e mimada, luta para manter seu “status quo” no seio familiar (que a aceita como uma garota sem chance de aprendizado), e que vai ser um grande desafio para a professora “domesticá-la” (sob os protestos da família, que desacredita na possível inteligência da menina) – repito, o embate corporal teatral das duas atrizes (abaixo) é magnífico, vale a pena assistir, seja você cinéfilo ou não.













sábado, 12 de março de 2011

Títulos de filmes: uma comédia a parte

Das inúmeras curiosidades do cinema, uma interessante é sobre os títulos dos filmes, sejam eles originais em inglês ou as versões em português (do Brasil e principalmente de Portugal) – às vezes soam estranhos, parecendo nada ter a ver com o enredo do filme, e muitas vezes soam hilários, num desencontro total, fugindo completamente da temática do filme.

Alguns títulos em inglês, como o esquisito “I Know what you did last summer” (baseado num livro homônimo), são uma comédia a parte (apesar de tratar-se, na verdade, de um suspense), e suas continuações então, nem se fala (“Eu ainda sei o que vocês fizeram no verão passado” e “Eu sempre vou saber o que vocês fizeram no verão passado”).

Por vezes, o título original em inglês parece estranho à primeira vista, como por exemplo, no filme “What’s eating Gilbert Grape”. Ao “pé da letra”, a tradução seria “O que está comendo Gilbert Grape”, sem nenhum sentido para o filme, mas na verdade parece tratar-se de uma espécie de expressão idiomática (ou seria uma gíria popular) que significaria “O que está havendo, Gilbert Grape”.

No Brasil, o título mudou para “Gilbert Grape: aprendiz de sonhador” (em Portugal foi mantido o título original) e condiz com a história de um rapaz, o tal Gilbert Grape do título (papel do ator Johnny Depp), às voltas com seus sonhos – sonhos estes limitados pela sua complicada família, uma mãe com obesidade mórbida e um irmão deficiente mental (o ator Leonardo DiCaprio, ainda bem menino, num papel bastante convincente) – já comentei sobre esse ótimo filme, no texto sobre a biografia cinematográfica de ”Ed Wood”(também com o ator “camaleão” Johnny Depp) – veja na lista de filmes no blog.

Assim, antes de criticar (e zoar) títulos de filmes, principalmente aqueles na versão portuguesa dos nossos irmãos da “terrinha”, é bom lembrar que, de repente, quem sabe o título bizarro pode ser uma expressão idiomática de Portugal que desconhecemos, pois sabemos que, apesar de praticamente falarmos a mesma língua, muitas palavras têm significado totalmente diferente na terra dos lusitanos. Por exemplo, um adolescente por lá é “um puto”, camisinha é “durex”, injeção é “pica”, e um grupo de crianças é chamado de “canalhas”. Assim, a confusão está armada (e com certeza, a “zoação”). 

A divertida entrevista do cantor português Roberto Leal no Jô Soares ilustra bem essas curiosidades e peculiaridades da língua lusitana em comparação com a nossa.

Assim é que muitas das versões lusitanas de títulos de filmes soam extremamente engraçados para nós, brasileiros. Por exemplo, a comédia romântica "Just Married", que aqui virou "Recém casados", lá na terrinha virou o hilário "Casados de fresco".  Já o premiadíssimo "Touro Indomável" (“Raging Bull”) de Martin Scorcese, em Portugal ganhou o título de “O touro enraivecido”.

O filme “Where the Wild Things Are”, de Spike Jonze, ganhou no Brasil o título “Onde Vivem os Monstros”, já na terrinha você vai ter que pedir na locadora pelo nome de “O Sítio das Coisas Selvagens”. Engraçado também ficou “Inglourious Basterds” (“Bastardos Inglórios”, no Brasil), de Quentin Tarantino, pois na língua lusitana virou “Sacanas Sem Lei” e, detalhe, com o subtítulo “uma infame, desvairada e empolgante jornada de vingança” – todos esses filmes já foram comentados aqui no blog (veja na lista de filmes).

O filme “Ordinary people” ganhou o título, no Brasil, de “Gente como a gente”, mas em Portugal chama-se “Gente vulgar” – primeiro filme sob a direção do ator galã Robert Redford, ganhou o Oscar de melhor filme na época, na década de 80 (veja no final do texto), e conta a comovente história de uma família marcada por um acidente, que vitimou um dos filhos, e um dos irmãos se sente responsável pela tragédia, e têm a mãe como um alicerce para a sustentação emocional da família – para nós, apesar da palavra “vulgar’ poder até significar “simples, popular”, na verdade soa muito mais como “algo desprezível, baixo, reles”, o que não condiz com o tema do filme, assim o título em Portugal parece equivocado, a não ser que o termo “vulgar” na terrinha tenha um significado diferente do nosso.

Já no Brasil, a comédia de produção independente que virou um Cult, de nome “Dow by Law”, do aclamado diretor Jim Jarmusch (do também cultuado “Estranhos no paraíso”e “Sobre café e cigarros”), recebeu o nome “abrasileirado” de “Daunbailó”(nada mais nada menos que a reprodução fonética do título em inglês) – já pensou se a moda pega? – o título esdrúxulo parece, no entanto, combinar com a irreverência do filme, todo em preto e branco, sobre a história de três personagens, dois americanos (na verdade não são atores, são compositores, e as ótimas músicas do filme são deles) que vivem aquém do sonho americano, e um estrangeiro (o ator italiano Roberto Begnini, de “A vida é bela”) que, com apenas um inglês bem básico, bem chinfrim, tem grande dificuldade de se expressar na língua inglesa (para isso usa um hilário caderninho de piadas para “se socializar”).

Os três se conhecem quando se vêem condenados a prisão, e têm que se unir para sobreviver, e planejam assim a fuga da cadeia (que na verdade nem é mostrada em detalhes). A fotografia do filme (uma Nova Orleans suja, às margens do rio Mississipi, retratada longe do circuito do jazz e do blues, e os pântanos do estado da Luisiana), embaladas pela ótima trilha sonora, é um show a parte.

E o filme tem cenas em longas tomadas (característica do diretor independente Jim Jarmush), para mostrar a decadência e passividade dos seus personagens à margem da sociedade. E o fime diverte na maioria das vezes. Durante uma cena em que os detentos começam a gritar nas celas, o italiano Begnini lança mão de seu caderninho e cria, no seu inglês sofrível, um verso com um jogo de palavras (talvez por isso também o título abrasileirado do filme): “I scream, you scream, we all scream for ice cream”, frase esta que passa a ser quase um “hino-desabafo” na prisão, desarmando as caras amarradas de seus novos amigos americanos (veja no final do texto).

E, voltando aos títulos, tinha aquela velha brincadeira de mímica da nossa infância “Adivinhe o nome do filme”, em que inventávamos títulos surreais como “Incêndio na caixa d’água”, “Poeira em alto mar”, “A volta dos que não foram” e “As longas tranças do careca”.

E corre solto na internet as piadas em torno dessa brincadeira de criança: O Hulk caiu sentado numa churrasqueira em brasa. Qual o nome do filme? “Tomates verdes fritos”. O Lula encontra o Vincentinho na cama com a mulher dele. Qual o nome do filme? “O que é isso, companheiro?” (aproveitem e vejam, no final do texto, trailer desses dois ótimos filmes).

Quanto às versões lusitanas, ainda persiste aquela velha fama dos portugueses, que todos conhecem – de que, em Portugal, nem é preciso ir ao cinema, pois já se conhece a história só pelo título – por exemplo, se o título no Brasil for “Quem matou fulano de tal?”, o mesmo filme terá, na “terrinha”, como título (ou subtítulo) o nome “Foi o mordomo”.

E continuando a “zoação” com os irmãos europeus, que sempre rola solta na internet: “Titanic” viraria “Vai batere em um pedaço de gelo e afundare”. “Ghost, do outro lado da vida” seria “O gajo demorou para entendere que já havia morrido”. O filme “A Era do Gelo” passaria a ser chamado “No tempo em que era frio prá cacete”. “Treze dias que abalaram o mundo" seria “Faltou pouco para todo mundo ir prá casa do cacete”. “A Fuga das Galinhas” viraria “As penosas não queriam ir para a panela”. “Todo Mundo em Pânico" viraria “Corre todo mundo que vai dar cagada” e “O Exorcista” seria “O gajo manda o capeta para o inferno”, e por aí vai a gozação. 












domingo, 6 de março de 2011

O cinema e o universo das drogas

O universo das drogas – sempre quando o cinema retrata esse tema, em geral, é sob um enfoque muito dolorido. E assim deve ser, pois não se pode amenizar quando se trata da vida humana e do poder de destruição das drogas.

“Ficar limpo” é possível, mas a estrada para tal é árdua, e o sofrimento é indecifrável e incalculável, por isso acho que o cinema tem que mostrar, sem rodeios, a dura realidade do mundo das drogas. E um ex-viciado nunca é 100% ex-viciado, ele precisa viver um dia de cada vez, e sobreviver ao dia seguinte. 

“Réquiem para um sonho” virou um Cult, ao retratar o mundo das drogas, tornando-se uma das obras-primas máximas do universo das drogas, ao usar uma linguagem cinematográfica moderna, ousada e dolorosamente realista. É a história de três jovens, viciados em drogas cada vez mais pesadas, e uma mãe também viciada (em medicamentos ditos lícitos, anfetaminas para emagrecer).


O filme mostra cronologicamente os sonhos dos jovens (a atriz Jennifer Connelly é um desses jovens) e depois da fase de “lua de mel” com as drogas, vem o processo de ruína, e o fim trágico de seus usuários, com mutilação de corpos e de vidas.

Quando se trata de drogas, dificilmente o final será feliz, para quem quer que seja, mesmo para os que se acham capazes de controlar o vício, os chamados “usuários sociais” – no filme, o personagem vivido pelo ator Marlon Wayans (mais conhecido pelos seus papéis em comédias como “As branquelas” e “Todo mundo em pânico”) faz o papel de um viciado que usa a droga inicialmente “a seu favor”, e que, equivocadamente, acha que tem controle sobre o seu vício. 

Ao som de uma trilha sonora incidental marcante e extremamente angustiante, a câmera movimenta-se freneticamente, em cortes rápidos, nos momentos de medo, ansiedade, insônia e pesadelos que se repetem a cada injeção – as pupilas que se dilatam, o líquido percorrendo rapidamente pelas veias, e as alucinações paulatinamente substituindo o prazer dos seus dependentes. Não há uma lição de moral no filme, cada um que julgue como quer se situar diante do que vai assistir, se as cenas impactantes (e isso com certeza elas são) serão suficientes para alertar sobre o poder de mutilação das drogas. 

Em “O casamento de Rachel” (veja trailer no final do texto), a atriz Anne Hathaway vive a irmã da Rachel do título, que sai temporariamente de uma clínica de reabilitação (para recuperação de viciados) para assistir ao casamento da irmã - o filme aborda a perspectiva de toda uma família para a volta da mimada filha problemática.

O interessante desse filme é que as câmeras que capturam a imagem da festa são em grande parte como se fossem as câmeras amadoras dos próprios convidados, fazendo o espectador se sentir as voltas de uma verdadeira reunião familiar, que inclui ter que lidar com os fantasmas de um passado antigo (que envolve um trágico acidente) e os problemas familiares (com suas brigas, seus erros e acertos) comuns a qualquer um de nós. A trilha sonora é ótima (“Everyday” de James Taylor e “Unknown Legend” de Neil Young - cantada pelo noivo - e com direito a uma "réplica" de uma escola de samba carioca) e o filme encantador, apesar de triste em muitos dos seus aspectos relacionados às drogas e seus efeitos deletérios sobre toda uma família.

Kurt Cobain, líder do grupo “Nirvana” encontrou um sósia a sua altura para reviver na telona os últimos dias de sua existência. No filme “Last days” (uma semi-biografia da carreira e da fatídica morte de Kurt Cobain), o ator e também músico Michael Pitt (inclusive bem parecido fisicamente com Cobain) vive a trajetória de um músico introspectivo, de caráter depressivo e destrutivo, que lida mal com o peso do sucesso.

Cobain mostrava-se perdido e desiludido com a fama, e apesar de repetidas insinuações e de tentativas de suicídio anteriores, ninguém foi capaz de conter o ímpeto autodestrutivo do músico, agravados em muito pelo seu envolvimento com drogas pesadas.

Kurt Cobain se sentia frustrado. "Fomos incapazes de mostrar o lado mais suave, mais dinâmico da banda", disse Kurt numa entrevista. "O som pesado de guitarra é o que garotada quer ouvir. Até quando eu serei capaz de gritar até arrebentar os pulmões toda noite, durante um ano inteiro de turnê?" finaliza a entrevista. Sentia-se prisioneiro da canção "Smells Like Teen Spirit" (veja no final do texto) e de toda badalação em torno do grunge-rock de Seattle, decorrente do sucesso daquela música e da transformação do seu nome em um ícone da música pop. 

Com “Laranja mecânica” (“A Clockwork Orange”), o aclamado diretor Stanley Kubrick causou controvérsia (e furor) no mundo do cinema em plena década de 70. Numa Inglaterra futurista, o ator Malcolm McDowel vive um jovem de classe média alta, líder de uma gangue de pervertidos, viciado em “leite batizado” que, após roubar, estuprar e matar “por diversão” (sempre ao som de uma estridente música clássica) é preso pela policia e usado como cobaia, num experimento governamental que (utilizando métodos nada ortodoxos e igualmente violentos) faria com que o indivíduo interrompesse seus impulsos violentos.

O mundo passava pela polêmica Guerra do Vietnã por trás da cortina da guerra fria, e o Brasil estava em plena ditadura, e o filme só foi liberado pela censura aqui no Brasil na década de 80, e mesmo assim só foi visto nos grandes centros urbanos e em sessões relâmpagos. E o filme questiona: quem é o mais violento? o jovem delinqüente ou o governo totalitário? Apesar de não abordar diretamente o tema sobre drogas (apesar da violência nitidamente agravada por elas), “Laranja mecânica” é um clássico do cinema cult.

Em “Gia, fama e destruição”, a bela atriz Angelina Jolie aceita o desafio para viver na telona a história real da modelo americana Gia Maria Carangi, que ainda no auge da carreira se entrega ao mundo das drogas pesadas, e morre consumida pela AIDS aos vinte e poucos anos de idade (veja no final do texto). 

E não se esqueça, antes de se enveredar nesse universo do cinema (e das drogas), é bom preparar-se, pois são todos filmes pesados, impactantes e depressivos, e a sensação de estar experimentando os mesmos desprazeres dos personagens é quase real, tal a violência desnuda das imagens cinematográficas que não poupam em momento algum o telespectador.













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